Conferência
do Clima chega ao fim sem avanços significativos em Doha
Prorrogação do Protocolo de
Kyoto em versão curta poderá ser única medida concreta na COP-18; metas
obrigatórias e recursos financeiros permanecem indefinidos
(Por Maurício Thuswohl, Rede
Brasil Atual - 07/12/2012)
Rio de Janeiro – É muito
baixa a expectativa dos ministros dos quase 200 países presentes a Doha, no
Catar, quanto ao sucesso da 18ª Conferência das Partes da Convenção sobre
Mudanças Climáticas da ONU (COP-18). Tanto que qualquer pequeno avanço nas negociações
já é cantado como grande vitória pelos diplomatas. Com encerramento
inicialmente previsto para hoje (7), a COP-18 deverá se estender por mais um
dia, tempo necessário para que os países ajustem um documento final que, no
lugar de medidas concretas e imediatas, trará, mais uma vez, somente promessas
de engajamento futuro.
Apesar da evidente
paralisia, diplomatas comemoravam em Doha a provável sobrevida do Protocolo de
Kyoto, cuja primeira fase expira em 31 de dezembro. Em negociação liderada pelo
Brasil, a segunda fase do Protocolo, que já recebeu o apelido de Kyotinho por conta
da baixa adesão, será garantida pela participação de Austrália, União Europeia,
Suíça e Noruega, únicos países com metas obrigatórias que ainda pregam respeito
ao acordo.
O principal objetivo dos que
defendem o prosseguimento do Protocolo de Kyoto, entretanto, é manter de pé a
arquitetura institucional prevista pela ONU para o setor ambiental e que dá
sustentação a instrumentos como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e o
mercado de créditos de carbono. Resta decidir se a segunda fase do Protocolo se
estenderá até 2017 ou 2020, quando está previsto o início da vigência da
Plataforma de Durban, que ainda não teve seus detalhes definidos.
Promessa que permanece de
pé, a Plataforma de Durban é acordo global que implicará na adoção de metas
obrigatórias de redução das emissões dos gases causadores do efeito estufa
tanto para os países industrializados quanto para os países emergentes ou em
desenvolvimento. Em Doha, foi definido que as discussões sobre a Plataforma de
Durban continuarão ao longo de 2013, até a COP-19, que acontecerá em Varsóvia,
na Polônia.
Terceiro eixo da COP-18, a
adoção do Fundo Verde Climático, que prevê investimentos de US$ 100 bilhões
anuais para que os países em desenvolvimento possam se adaptar às conseqüências
do aquecimento global e adotar políticas sustentáveis de crescimento econômico,
também ficou para mais tarde. Até o último dia da conferência, o único país a
anunciar novos aportes foi a Inglaterra, que destinará 1,8 bilhão de libras
(cerca de US$ 3 bilhões) ao Fundo nos próximos dois anos.
Mais do mesmo
Em nota divulgada hoje, a
organização brasileira Instituto Vitae Civilis, que acompanha de perto as
negociações climáticas multilaterais nas duas últimas décadas, criticou a
letargia dos governantes na COP-18: “Mais uma Conferência das Partes sobre
Mudanças do Clima se encerra sem os resultados necessários para que o aumento
da temperatura média do planeta fique abaixo dos 2 graus centígrados. Doha faz
parte de um legado de incertezas e incompetências”, diz o documento.
Segundo a organização, que
integra a rede internacional Climate Action Network (CAN), e o Fórum Brasileiro
de ONGs e Movimentos Sociais pelo Desenvolvimento Sustentável (FBOMS), em Doha
“assumiu-se despudoradamente que simplesmente manter as conversas é o resultado
a ser atingido” nas reuniões sobre mudanças climáticas.
Os ambientalistas são
taxativos: “Desde 2009, todo o trabalho dos negociadores tem gerado apenas o
alargamento do cronograma para um acordo final. Estamos perigosamente nos
aproximando do ponto a partir do qual não há volta. Se as emissões dos gases
causadores do efeito estufa não começarem a diminuir a partir de 2015, teremos
fracassado. No futuro, seremos reconhecidos como a geração que condenou seus
filhos e netos”.
Brasil protagonista
Assim como nas últimas COPs
sobre mudanças climáticas, o governo brasileiro assumiu em Doha um papel de
liderança ao aceitar a missão de coordenar os esforços por um acordo que
garanta a segunda fase do Protocolo de Kyoto. A ministra brasileira do Meio
Ambiente, Izabella Teixeira, chegou na quarta-feira (5) ao Catar enfatizando a
importância do prosseguimento de Kyoto e também da adoção da Plataforma de
Durban a partir de 2020: “Estamos caminhando para uma nova fase, que
fortalecerá ainda mais o princípio das responsabilidades comuns, porém
diferenciadas”, disse.
Apesar das boas intenções
manifestadas pelos líderes globais, o problema continua sendo a urgência
imposta pela crise climática, que se agrava em velocidade inversamente
proporcional às negociações diplomáticas. Enquanto se comemora a sobrevida de
um Protocolo de Kyoto cada vez mais fragilizado, uma pesquisa realizada pelo
grupo Global Carbon Project e divulgada durante a COP-18 mostra que as atuais
emissões globais de gases estufa estão 54% acima do patamar de 1990, ano-base
utilizado para o cálculo das metas impostas por Kyoto.
“Ninguém, seja rico ou
pobre, está livre das mudanças climáticas. Estamos diante de um grande desafio
existencial para toda a raça humana, que pode alterar profundamente nosso estilo
de vida e nossos planos para o futuro”, advertiu em Doha o secretário-geral da
ONU, Ban Ki-Moon. Salvo improváveis mudanças de última hora, a capital do Catar
entra para a história das COPs como cenário perfeito para pregações no deserto.