domingo, 17 de junho de 2012

REPORTAGEM: DA ECO 92 A RIO + 20


Da Eco92 à Rio+20: mesma essência, novos desafios
  
São Paulo – Passados 20 anos da Eco92, a Conferência da ONU para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, tem basicamente a mesma essência de duas décadas atrás. Àquela época, o cenário mundial já clamava por um início de mudanças efetivas: o termo desenvolvimento sustentável era delineado, ainda que praticamente desconhecido; era sabido que a emissão de gases poluentes na atmosfera acelerava o aumento da temperatura do planeta e que acordos para retardar esse aumento eram indispensáveis. Alguns foram assinados, ali ou mais tarde, como o Protocolo de Kyoto e a Agenda 21, metas foram postas à mesa, mas a balança garantiu um peso maior ao sucesso que ao fracasso, conforme as expectativas. E é este anseio que renasce agora.
A Rio+20 também clama por novos rumos, mas com outras prioridades que, na visão de especialistas, definirão o futuro da humanidade. Economia verde, governança global, fortalecimento de um organismo da ONU voltado ao meio ambiente, outro indicador para mensurar o desenvolvimento estão entre as principais discussões – e também enérgicas desavenças entre ONU, bloco dos países em desenvolvimento e ricos. Novos padrões de consumo e criação de fundos para uma nova economia também norteiam a conferência.
"Precisamos administrar o futuro da humanidade. Pode parecer ambição desmedida, mas eu acho que é essencial. É isso que leva a dizer que, apesar de todos os fracassos, eu continuo a acreditar na ideia de um planejamento democrático", diz o economista Ignacy Sachs, um dos nomes mais importantes quando o assunto é desenvolvimento sustentável.
As divergências entre priorizar crescimento econômico ou a proteção ambiental representam um dos fatores que polarizam ainda mais a negociação sobre "o que esperar da Rio+20". De um lado, países emergentes, principalmente os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), tentam fazer com que as nações ricas se voltem ao passado e reconheçam a responsabilidade pelo atual estágio de escassez de recursos naturais, desigualdades sociais e, como não poderia deixar de ser, uma crise econômica que preconiza o resgate ao capital e minora as questões sociais.
De outro, o bloco dos países desenvolvidos é aquele que, prioritariamente, defende a chamada "economia verde". Para eles, é o único meio de nivelar desenvolvimento econômico com questão ambiental. No entanto, com certo ceticismo, os emergentes veem que essa nova divisão economia poderia "capitalizar" a natureza, ou seja, colocar à venda aquilo que ainda não foi privatizado – e livrando mais uma vez os países desenvolvidos de assumirem suas (ir)responsabilidades. Há entre os emergentes aqueles que enxergam a economia verde como mais uma barreira protecionista, com normas ambientais rígidas que impedem a exportação de países pobres (por falta de tecnologia) para os ricos.
No que se refere a quem pagará a conta da transição, nações como Estados Unidos e Alemanha, defendem que o papel da China não represente apenas um mero emergente. Por já ter se tornado uma das maiores economias mundiais e aumentar rapidamente suas emissões de gases poluentes, o país asiático deveria também entrar na divisão da conta para uma transição "verde" da economia.
O governo brasileiro afirma que o grupo do G-77 mais a China, do qual o Brasil faz parte, tem uma proposta para a criação de um fundo internacional de US$ 30 bilhões por ano para financiar esse processo. Essa proposta, inclusive, está incluída no texto final da conferência, que ainda não foi finalizado.
Contudo, com uma crise econômica nas entranhas do sistema capitalista, os países desenvolvidos, principalmente os europeus, desenham limites aos possíveis investimentos destinados a uma economia verde. Atingindo, no máximo, o valor de 0,07% de suas riquezas totais. Resultando em mais um impasse que pode – ou não – ser resolvido durante a Rio+20.
Além disso, a conferência buscará também estabelecer os chamados objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) em áreas como segurança alimentar, energia e acesso à água. Os ODSs sucederiam aos objetivos do desenvolvimento do milênio, que elencaram uma série de metas a serem cumpridas em termos de inclusão social. Com validade a partir de 2015, os novos objetivos teriam de passar por negociação para que pudessem ganhar efeito "legalmente vinculante", ou seja, implicar em compromissos que teriam de efetivamente ser cumpridos. 
Considerações
Para o economista da PUC de São Paulo Ladislau Dowbor, a crise financeira – classificada por ele como civilizatória – se mostra como uma oportunidade para expor os defeitos do sistema atual e facilitar as convergências em torno de um novo modelo. “O que funciona é onde as pessoas são organizadas em torno de seus interesses. É simples e democrático assim”, afirmou. “Estamos frente a uma mudança profunda caracterizada por uma crise civilizatória que envolve a mudança cultural. O ritmo de agravamento dos processos é muito mais acelerado do que nossa capacidade de transformação".
Ricardo Abramovay, professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Ciências Contábeis da USP, afirma que o desafio é produzir mais para a base da pirâmide social, incluindo mais gente na classe média. Para ele, a questão crucial que se atrela ao problema da desigualdade e à ecoeficiência é a real motivação do modo de produção mundial.
“Precisamos discutir não como a máquina do sistema econômico vai continuar girando, mas para quê ela vai continuar girando. Essa lógica é inaceitável em um mundo de 7 bilhões de habitantes. Temos de fazer a pergunta elemental: para que isso serve? Que bens, que serviços reais estão sendo proporcionados à vida real?”, questionou. “Não se trata de se dizer contra o crescimento econômico. Isso é bobagem. A questão é crescer em qual direção, para usar como os produtos”, defende.

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