quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

REPORTAGEM: SANEAMENTO BÁSICO- DIFICULDADES DE INVESTIMENTO

Estudo mostra dificuldade para se investir em saneamento
Valor Econômico, 29-12-2011
André Borges

A precariedade da infraestrutura de saneamento básico do país tem sido alimentada pelas dificuldades que o setor privado enfrenta para investir nesse setor. Um estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mapeia os principais obstáculos encontrados pelo empresariado e aponta que, quatro anos após a Lei de Diretrizes Nacionais para o Saneamento Básico ser sancionada, o saneamento continua a ser terreno árido para investimentos.

De acordo com a CNI, o setor - que inclui tratamento e distribuição de água e tratamento e redes de esgoto - realiza hoje investimentos anuais de cerca de R$ 5 bilhões, além de consumir R$ 2,6 bilhões em energia e aproximadamente R$ 600 milhões no uso de produtos químicos. Como a oferta desses serviços ainda é muito baixa, há um forte potencial de expansão de negócios em áreas como construção e engenharia, fornecimento de equipamentos, serviços financeiros, estudos ambientais, serviços de energia, entre outros.

"Acontece que a burocracia é tanta que o próprio governo não consegue sequer gastar os recursos que aloca para o setor", diz José Mascarenhas, presidente da CNI. "Os empresários têm todo o interesse em participar desses projetos, seja por meio de concessões ou Parcerias Público-Privadas, mas tem que haver uma política para o saneamento, com regras claras."

Um dos problemas apontados pelo estudo é a falta de uma definição clara de quem é o responsável - o Estado ou o município - pela prestação dos serviços de saneamento. Essa situação, de acordo com a CNI, ameaça a legitimidade da regulação de determinados contratos, porque não permite saber quem é o poder concedente e, tampouco, quem é o responsável por estabelecer as condições em que o serviço será prestado pelo concessionário. A política tarifária do setor também deveria ser vinculada aos custos específicos da obra, exigindo mais eficiência do prestado de serviço.

A indústria também reclama da burocracia para captar financiamento. O tempo médio para a contratação de financiamentos com bancos públicos para investimentos no setor de saneamento varia entre um ano e meio e dois anos. "Embora o mercado de capitais apresente custos e prazos menos favoráveis, ele é preferível por causa das dificuldades da operacionalização e dos critérios de elegibilidade do fomento", diz o relatório.

A necessidade de se criar uma agência reguladora também é destacada pelos empresários. Hoje essa função fica nas mãos dos municípios, que muitas vezes não têm meios de fiscalizar os serviços prestados. Atualmente, essa infraestrutura está nas mãos das companhias estaduais de saneamento básico, que são majoritariamente formadas por sociedades de economia mista ligadas à administração pública.

"Sabemos que saneamento básico é uma questão de política pública, mas o governo tem de deixar de ser tão fundamentalista quanto a isso", comenta Mascarenhas. "Há pessoas que dizem que o governo está privatizando a água. É uma visão absolutamente equivocada. A indústria sabe como realizar as obras, ela pode e deve participar dos projetos."

Os investimentos realizados em saneamento no país, conforme informou o Valor nesta semana, frustraram as expectativas de crescimento para 2011. Segundo informações do Ministério das Cidades, houve estagnação dos desembolsos em relação a 2010, e as liberações da Caixa Econômica Federal indicam queda até novembro.

Cálculos da ONG Contas Abertas apontam que o gasto total do orçamento da União em saneamento em 2011 até novembro foi de R$ 1,9 bilhão, frente a R$ 2,4 bilhões em 2010, dos quais R$ 1,5 bilhão são restos a pagar. As contratações da Caixa para projetos do setor cresceram de R$ 3,4 bilhões em 2010 para R$ 9,2 bilhões em 2011, mas os valores liberados caíram de R$ 3 bilhões em 2010 para R$ 2,3 bilhões até novembro.

Atualmente, 41% da população do país não tem coleta de esgoto. Do lixo que é coletado, apenas 38% é tratado. A água chega a 84% das pessoas, mas a rede de abastecimento é precária, com alto índice de perda até chegar à torneira. Segundo a CNI, o prejuízo médio no faturamento das empresas de abastecimento é de 37%, mas há casos em que ele passa dos 50%.

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